Uma investigação conduzida pelo jornal O Globo trouxe à tona possíveis irregularidades envolvendo o programa Cozinha Solidária, que deveria fornecer marmitas para comunidades carentes. A denúncia aponta que ONGs contratadas para o projeto, mesmo sem cumprir as entregas previstas, apresentaram relatórios de prestação de contas que indicavam fornecimento regular das refeições.
Fraude em programa de marmitas
O programa Cozinha Solidária foi lançado pelo governo federal com a promessa de atender comunidades vulneráveis em 12 estados do Brasil. Em São Paulo, diversas ONGs receberam recursos para a distribuição de marmitas, mas evidências levantadas pela reportagem sugerem que as entregas não ocorreram conforme o estipulado em contrato.
Entre as organizações envolvidas, a ONG Mover Helipa, responsável pela gestão de contratos em São Paulo, subcontratou outras entidades. Dentre elas, a Cozinha Solidária Madre Teresa de Calcutá, localizada no Jardim Varginha, zona sul da capital paulista, deveria entregar 4.583 refeições por mês. No entanto, moradores da região relataram não ter conhecimento sobre a distribuição de marmitas no local.
ONG Madre Teresa de Calcutá
De acordo com a reportagem, em janeiro, a ONG declarou ter produzido 250 marmitas, apenas 5% do estipulado em contrato. Apesar disso, em dezembro de 2024, apresentou recibos indicando o fornecimento total das 4.583 refeições, com valores recebidos que somaram R$ 11 mil. A responsável pela organização, Paula Souza Costa, ex-assessora do ex-vereador Arselino Tatto (PT), justificou as entregas como sendo realizadas em parceria com outra ONG da região.
ONG Unidos pela Fé
Outra entidade investigada, a Cozinha Solidária Unidos Pela Fé, localizada em Parelheiros, também na zona sul de São Paulo, foi contratada para entregar 4.583 marmitas mensais. Claudinei Florêncio, representante da ONG e ex-assessor de Arselino Tatto, admitiu que nenhuma refeição foi distribuída desde o início do contrato, mas relatórios apresentados ao governo indicavam o fornecimento integral das marmitas em dezembro de 2024.
A análise dos relatórios entregues ao Ministério do Desenvolvimento Social revelou semelhanças suspeitas entre os documentos de diferentes ONGs. Os metadados dos arquivos indicam que 13 relatórios foram criados por um mesmo usuário, Fábio Rubson da Silva, advogado ligado à ONG Mover Helipa, durante a última semana de dezembro de 2024.
Essas semelhanças levantam suspeitas sobre a autenticidade das informações prestadas e reforçam as denúncias de fraude em programa de marmitas.
Verba Federal e ligação com Grupos Políticos
Diversas ONGs beneficiadas pelo programa possuem vínculos com membros ou ex-membros de gabinetes do Partido dos Trabalhadores (PT). A Cozinha Solidária Instituto Rosa dos Ventos, gerida por Anderson Clayton Rosa, assessor do deputado Nilto Tatto, entregou apenas 400 refeições em janeiro, conforme relatórios apresentados, bem abaixo do contratado.
Outro exemplo é a ONG Divino Espírito Santo, vinculada a um ex-assessor do deputado Luiz Fernando Teixeira (PT-SP). No endereço da entidade, localizado em Sapopemba, zona leste de São Paulo, vizinhos relataram que a produção média mensal é de 2.100 marmitas, menos da metade do previsto.
José Renato Varjão, responsável pela ONG Mover Helipa, afirmou que visitaria os locais para verificar a execução do projeto. Ele classificou como coincidência o envolvimento de pessoas ligadas ao PT nas organizações subcontratadas e garantiu que recursos serão devolvidos caso irregularidades sejam confirmadas.
O Ministério do Desenvolvimento Social informou que irá monitorar o andamento do programa e visitar os locais mencionados. Caso as denúncias sejam comprovadas, medidas como suspensão de repasses e exigência de devolução de recursos podem ser aplicadas.