A Câmara dos Deputados voltou a discutir a possibilidade de avançar com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que visa restringir as decisões monocráticas no Supremo Tribunal Federal (STF). A medida ganha força após recentes conflitos institucionais com a Corte, especialmente no caso que envolve o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), reacendendo o debate sobre o equilíbrio entre os Poderes.
Conflito entre Câmara e STF reacende debate sobre decisões monocráticas
A tensão entre os Poderes se intensificou após o STF anular, de forma parcial, uma decisão da Câmara que favorecia Ramagem. O tribunal determinou que apenas parte das acusações contra o deputado fosse suspensa, e apenas ele se beneficiaria da decisão, o que irritou parlamentares.
Diante do episódio, cresceu a pressão dentro da Câmara para retomar a tramitação da PEC que visa limitar as decisões monocráticas, ou seja, tomadas individualmente pelos ministros do Supremo. A proposta, aprovada ainda em 2023 pela Comissão de Constituição e Justiça, é originária do Senado e integra um pacote de medidas voltadas a conter o alcance de decisões judiciais que impactam diretamente o Legislativo.
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirmou que pretende dar prosseguimento ao debate sobre a PEC como forma de resposta institucional ao STF. Em suas redes sociais, Motta anunciou que a Casa ingressou com uma Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) para que o caso envolvendo Ramagem seja analisado pelo plenário do Supremo.
A articulação foi feita com apoio de aliados e interlocutores próximos, que enxergam na proposta uma maneira de proteger a autonomia legislativa. Segundo eles, decisões monocráticas têm sido utilizadas de maneira recorrente, muitas vezes sem diálogo prévio com o Congresso Nacional, o que contraria os princípios da separação entre os Poderes.
Estatísticas mostram um crescimento expressivo das decisões monocráticas no Supremo ao longo dos últimos anos. De acordo com dados de levantamento recente, em 2007 foram apenas seis liminares concedidas de forma individual em Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) e Ações de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs). Em 2020, esse número saltou para 92, sendo registradas 71 decisões semelhantes somente no ano passado.
Esse aumento chamou a atenção de parlamentares, que apontam o uso frequente desse tipo de decisão como uma forma de enfraquecimento do processo democrático e do diálogo entre os Poderes. A avaliação é de que o STF tem interferido com frequência em assuntos legislativos sem a devida apreciação colegiada.
Críticas à atuação do Judiciário e medidas institucionais
O descontentamento com o Judiciário não se limita ao caso Ramagem. Deputados já haviam demonstrado insatisfação com o bloqueio de emendas parlamentares destinadas à saúde e com pedidos de explicações a líderes partidários feitos diretamente por ministros do STF, como Flávio Dino.
Nos bastidores da Câmara, considera-se que tais ações poderiam ter sido conduzidas com mais diplomacia, por meio de diálogo direto com a presidência da Casa. Em resposta a esse cenário, foi criada recentemente uma secretaria dedicada à defesa das prerrogativas e imunidade parlamentar.
Apesar da aprovação inicial na Comissão de Constituição e Justiça, a PEC ainda precisa de uma comissão especial para ser votada no plenário da Câmara. Essa etapa depende de decisão do presidente da Casa, o que não ocorreu na gestão anterior de Arthur Lira (PP-AL). Com Motta à frente da presidência, a expectativa é que a tramitação ganhe novo fôlego.
Entre os parlamentares, a avaliação é de que a estratégia deve ser cautelosa. A prioridade, por ora, é focar na PEC das decisões monocráticas, evitando propostas mais polêmicas, como a revisão de decisões do STF pelo Legislativo ou mudanças nas regras de indicação de ministros.