O Brasil é uma nação dotada de vastos recursos naturais, potencial humano excepcional e uma localização geopolítica estratégica. Apesar disso, o país patina em ciclos de estagnação econômica e instabilidade social. Para além das análises econômicas tradicionais, há uma variável muitas vezes negligenciada nos diagnósticos do não crescimento brasileiro: a profunda crise moral e ética que corrói a confiança nas instituições e paralisa a ação coletiva.
Ao longo das últimas décadas, sucessivos escândalos de corrupção envolvendo os Três Poderes da República — Executivo, Legislativo e Judiciário — têm minado a credibilidade do sistema político e judicial. A consequência direta desse processo é a perda de legitimidade das instituições perante a população. Pesquisa após pesquisa confirma a tendência: uma parte significativa dos brasileiros não acredita que os governantes atuem em benefício do bem comum. Pior ainda, essa descrença se estende à própria ideia de representação política, à imparcialidade da Justiça e à eficácia das leis.
Essa erosão da confiança institucional tem efeitos devastadores para o crescimento econômico. Investimentos são desestimulados quando o ambiente jurídico é instável ou politicamente contaminado. O empreendedorismo sofre com a insegurança regulatória e a burocracia ineficiente, alimentada por práticas clientelistas. A meritocracia cede espaço ao apadrinhamento, e o espírito cívico é substituído pelo cinismo social.
Um episódio recente ilustra com clareza essa crise simbólica: ao declarar que “a democracia é relativa”, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva lança uma sombra sobre o próprio fundamento do regime republicano. A frase, que relativiza um dos pilares do Estado de Direito, ressoa como um sinal preocupante. Em vez de consolidar valores democráticos universais, propaga-se a ideia de que tais princípios são adaptáveis conforme interesses ou conjunturas. Essa ambiguidade mina a autoridade moral do chefe de Estado, que para ser respeitado precisa, antes de tudo, ser admirado. A liderança política só é efetiva quando baseada não apenas em força institucional, mas em virtude e coerência ética.
Além disso, a cultura da transgressão das regras se normalizou em diversas esferas da sociedade. Do pequeno ao grande delito, da sonegação fiscal ao desvio de verbas públicas, instaurou-se uma lógica em que “levar vantagem” parece mais racional do que agir com integridade. Essa crise de valores, mais do que qualquer desequilíbrio fiscal, compromete a coesão social necessária para reformas estruturais duradouras.
O Brasil não crescerá de maneira sustentável enquanto não reconstruir um pacto ético. Isso implica reformar as instituições para que sejam mais transparentes, eficientes e representativas. Mas implica também uma profunda transformação cultural, que comece pela educação moral nas escolas, pelo exemplo dos líderes e pela responsabilização real dos que traem a confiança pública.
Em resumo, o crescimento do Brasil está menos atrelado à falta de recursos e mais à escassez de valores. A crise é menos técnica e mais moral. E enquanto essa chaga não for tratada, qualquer avanço será sempre frágil, superficial e passageiro.
*Haroldo Arruda Junior é professor Doutor em Filosofia e Analista Político.