O nome de Eduardo Tagliaferro, perito em crimes cibernéticos e ex-servidor do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ganhou destaque em meio a um escândalo envolvendo o vazamento de mensagens de membros da Corte. Na tarde de ontem, ele concedeu uma entrevista à revista Oeste onde revelou detalhes do seu envolvimento na chamada ‘vaza toga’.
A Trajetória de Tagliaferro no TSE
Eduardo Tagliaferro desempenhava um papel crucial no TSE como chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação (AEED). Sua função incluía a apuração, investigação e elaboração de relatórios solicitados pelo então presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes. Durante seu período na Corte, Tagliaferro era visto como um profissional de confiança, responsável por tarefas sensíveis e estratégicas.
Tagliaferro afirma se sentir isolado pelos colegas do TSE após sua exoneração. “Estou sendo perseguido”, afirma.
O Vazamento das Mensagens
O escândalo veio à tona quando a Folha de S.Paulo publicou uma série de reportagens baseadas em mensagens vazadas de integrantes do TSE. Das 11 matérias publicadas pelo jornal, Tagliaferro é mencionado em dez, evidenciando sua relevância no caso. A divulgação dessas informações causou grande repercussão, levantando questões sobre a segurança e a transparência nos processos internos do Tribunal.
Acusações e Defesa
Após o vazamento, Eduardo Tagliaferro passou de homem de confiança a suspeito principal. As acusações sugeriam que ele seria o responsável pelo compartilhamento não autorizado das mensagens. Em resposta a essas alegações, Tagliaferro negou veementemente qualquer envolvimento com o vazamento dos dados.
A Versão de Tagliaferro
Na entrevista, o ex-servidor do TSE apresentou sua versão dos fatos. Tagliaferro levantou a hipótese de que as informações poderiam ter sido coletadas quando seu celular foi apreendido pela Polícia Civil de São Paulo em 2023, durante uma investigação por violência doméstica – acusação que ele também nega.
Esta declaração abre uma nova perspectiva sobre a origem do vazamento, sugerindo possíveis falhas na cadeia de custódia de evidências digitais.
Revista Oeste: – O senhor vazou as mensagens para o jornalista Glenn Greenwald?
Tagliaferro: – “Não, porque conheço Alexandre de Moraes. Conheço antes de sua entrada no Supremo Tribunal Federal. Conheço bem sua personalidade. Eu jamais teria coragem”.
Procedimentos e Hierarquia no TSE
Tagliaferro forneceu detalhes sobre o funcionamento interno do núcleo de Inteligência do TSE. Segundo ele, as ordens eram recebidas diretamente de Airton Vieira, juiz auxiliar de Alexandre de Moraes, e de outros juízes auxiliares. O ex-servidor afirmou que muitas dessas ordens tinham caráter de urgência, o que poderia sugerir a existência de pressões e demandas intensas dentro da Corte.
Revista Oeste: – Como os relatórios eram produzidos?
Tagliaferro: – “Eu recebia o material por WhatsApp, porque o ministro era tanto do STF quanto do TSE. Existia certa urgência para atuar, para intervir, porque o discurso sempre era de que iria ter golpe, que iria ter alguma coisa desse gênero. Então, o medo era de que, se não fosse ágil, algo poderia acontecer ao país. O trabalho era muito rápido. O relatório, de minha parte, era oficial. Se havia mensagens de ódio, informava. Havia denúncias anônimas, mas também houve denúncias que vinham do próprio ministro.
Questionamentos Éticos e Legais
Embora tenha admitido ter dúvidas sobre alguns dos processos realizados no TSE, Tagliaferro afirmou que cumpria as ordens recebidas.
Ele fez questão de ressaltar que não utilizou meios ilegais para obter informações, buscando se distanciar de qualquer acusação de conduta ilícita. Esta declaração levanta questões sobre os limites éticos e legais das atividades realizadas dentro do Tribunal.
Revista Oeste: – O senhor entende o desespero das pessoas que foram perseguidas por Alexandre de Moraes?
Tagliaferro: – “Sei que meu trabalho fez parte disso, mas não tive opção. Eu era um funcionário. É como se fosse um cozinheiro e o dono do restaurante falasse assim: “Quero que você faça feijoada hoje; coloque beterraba na feijoada”. Suponha que respondi: “Ah, mas beterraba não”. E o chefe respondeu: “Não. Põe beterraba”. Está bem, colocarei a beterraba”.
Revista Oeste: – O TSE e o STF acionaram o senhor, para investigar os atos do 8 de janeiro?
Tagliaferro: – “Houve um pedido do STF para a realização de um levantamento de dados dos manifestantes. Ficha civil, vamos dizer assim. A equipe de investigação produziu esses documentos. Foram semanas de trabalho. Cerca de 1,5 mil pessoas estavam na lista. Eram as pessoas que foram presas”.
Revista Oeste: – Acredita que houve tentativa de golpe no 8 de janeiro?
Tagliaferro: – “Esse tipo de golpe, na minha concepção, é concretizado por militares. É o que sempre estudei na história. Isso não ocorre pelas mãos dos civis, que estavam desarmados. O problema todo foi o quebra-quebra ali. Invadir um prédio público é errado”.
Relação com Alexandre de Moraes
Um ponto interessante revelado por Tagliaferro é sua limitada interação direta com o ministro Alexandre de Moraes. Segundo ele, houve apenas três ou quatro contatos diretos com o ministro, o que sugere uma estrutura hierárquica bem definida e possivelmente distante entre o alto escalão e os servidores operacionais do TSE.
Consequências pessoais e profissionais
O escândalo teve um impacto significativo na vida pessoal e profissional de Eduardo Tagliaferro. Após sua exoneração do TSE, ele relata sentir-se isolado e perseguido. A perda de contato com ex-colegas do Tribunal evidencia o ostracismo enfrentado por servidores envolvidos em controvérsias de alto perfil.
Investigação em Curso
Atualmente, Tagliaferro é alvo de uma investigação conduzida pela Polícia Federal em São Paulo, instaurada por ordem do ministro Alexandre de Moraes. O ex-servidor já prestou depoimento às autoridades, mantendo sua posição de inocência quanto às acusações de vazamento.
Apesar de afirmar estar tranquilo em relação ao processo no qual figura como testemunha, Tagliaferro admite temer possíveis retaliações. Esta preocupação reflete o clima tenso que envolve casos de vazamento de informações sensíveis, especialmente quando relacionados a instituições de alto escalão do poder judiciário.